Carnaval Na Bahia, Não Precisa Explicar
Há quem me chame de crítico e analítico, entretanto só posso dizer a meu respeito que sou observador e, capacitado a formar opiniões; e se as mesmas desagradarem algúns me será motivo de grande prazer. O Carnaval de Salvador foi ótimo! Tanto que lá perdi seis noites e uma manhã. A festa é organizada com grande antecedência para que em seu decorrer a desordem não só reine como também governe. Mas uma desordem organizada, sim senhores. Afinal, que ordem pode prevalecer frente ao jeitinho brasileiro numa terra onde todos os absurdos conhecem precedentes?
Que o diga sua magestade sem trono, que me concedeu audiência próximo ao beco da dita boite OFF Club para reclamar a sua coroa que fora entregue ao proprietário da Cantina Da Lua, Clarindo Silva (que deve pesar quarenta quilos) em seu lugar em 2008. E como se não bastasse o fato de um coitado passar um ano se empanturrando de porcarias para ficar mais gordo e eleger-se Rei Momo (e conseguir!) não poder reinar porquê na Bahia Momo agora é "ultra light", há também a questão Ghandy:
Pasmem! "Os filhos de Ghandy" (que jamais fizeram qualquer alusão à Índia - terra daquele que os denomina) agora são brancos! É! "Negão" agora, só entra por cotas.
A agremiação fundada ha mais de cinquenta anos por estivadores do porto de Salvador (que não deviam saber nada sobre a Índia), encontrou em Gilberto Gil, seu ex-presidente, atualmente de honra e ex-ministro da Cultura, figura de ideologia tão intrigante quanto o dialeto que fala nas entrevistas que dá, uma locamotiva turbinada rumo ao capitalismo selvagem.
Ainda que se perca um pouco de identidade cultural será melhor assim. Aqueles "negões", embora pacifistas, carismáticos e apaziguadores nessa festa violenta (sem falar "pegadores") eram também uns pés rapados; no tempo em que eram a maioria a fantasia custava quase a metade do que custa hoje. Por falar em "hoje", aquela Lavanda cheirosa que aspergiam nas meninas agora é de ralé e não se sente mais. A coisa agora começa por Channel, um olor melhor que o outro. As meninas pobres que não podem comprar um daqueles e não viram o Ghandy esse ano não sabem o que perderam.
Tradição que é tradição na Bahia se modifica! Sem essa de "Identidade Cultural", aliás: tentar empedir que o carnaval baiano perca sua identidade dadas as nulidades que o dirigem, seria tão ridículo quanto exigir que o mesmo tenha CPF.
O que é bem diferente de renovação. Daniela Mércury, por exemplo, renova-se a cada ano e leva consigo o próprio Carnaval. Foi assim quando decidiu desfilar da Barra à Ondina, criando com isso um novo circuito, que se já vinha sendo planejado pela prefeitura precisou do seu empurrão para se tornar realidade mais rápido, além da idéia do seu camarote, que é hoje parada obrigatória dos trios para reverenciá-la e foi copiado por todos, de todas as formas e virou um mega negócio financeiro.
Só o que não se modifica nem se renova é o povo com o qual temos que topar por esses dias excepcionais. Aquelas garotas suadas com seus shortinhos jeans e suas toalhinhas de rosto brancas penduradas, aff! Sem falar dos cabelos fossilizados com todo aquele creme para pentear que não resiste à primeira "Dandalunda" que Margareth Menezes jogue, e se liquidifica, voando a toda velocidade em nossa direção - entra até na boca. Depois desse processo nossas peles ficam peguentas, e os cabelos delas...esqueçam. Mas nada seria original na festa se as pessoas não fossem elas mesmas naquilo em que não faz mal a ninguém só para parecerem elegantes - antônimo de baiano.
Mas apesar das incertezas quanto ao futuro dessa festa algo está mais que garantido: até que chegue "O fim da odisséia humana na Terra", em todos os tempos vindouros, a essa época do ano haverá gente nas ruas da cidade em busca de uma grande embriaguêz ao som de um Trio Elétrico, com latinhas nas mãos, catadores aos pés e respirando o aroma vindo dos muros urinados. Eis aqui a Cidade da Bahia!